As revoluções iluministas no Ocidente, a partir do século XVIII, inauguraram um experimento único na história humana: o Estado moderno, caracterizado pelo seu secularismo anticristão.
De fato, a revolução francesa, abre-alas sangrento da ação política iluminista, não dispõe de melhor símbolo para sua obra do que a guilhotina, instrumento de morte que separa a cabeça do corpo da sua vítima.
A cabeça, a razão, até então, do Ocidente repousava na cultura clássica e cristã, herdada da Grécia Antiga e do Império Romano, preservada do barbarismo pela Igreja Católica Apostólica Romana, durante séculos.
A ciência, a filosofia, a metafísica, as artes, a arquitetura, a moral, entre outros tesouros, foram um legado da Igreja, fundadora de universidades, hospitais e observatórios astronômicos.
Contra essa herança milenar, especialmente o código moral e ético cristão, que se ergueram os iluministas. Seu projeto produziu uma anomalia na história humana: a separação do Estado e da Igreja.
Antes do secularismo radical, jamais uma sociedade havia afastado a moral religiosa – qualquer que fosse sua base teológica, cristã ou não, a religião sempre determinara as regras de autoridade e de comportamento, tanto dos soberanos como dos súditos, definindo direitos e deveres, limitações e punições.
Já o cerne da ideologia iluminista concentrara-se em substituir a moralidade religiosa, cuja legitimidade emanava da graça divina, portanto, por princípio imune às imperfeições humanas, por uma moralidade secular, baseada num corpo de leis supostamente impessoais, racionais, tecnicistas, em suma, “modernas”.
Assim, do dia para a noite, milênios de experiência humana foram abandonados em prol de um experimento incerto, imprudente e jamais testado: o secularismo, forjado para suplantar o compromisso da sociedade com a lei divina pela servidão à lei humana.
Se Rousseau, Voltaire, Montesquieu, Hobbes e Locke constituem alguns dos maiores formuladores do pensamento iluminista, não é de se estranhar que, ao remover Deus como norte moral, buscando elevar o ser humano – criatura falha, repleta de vícios e com um potencial ilimitado para a maldade – o grande intelectual da degradação moral e política francesa seria o marquês de Sade.
A virtude e a caridade cristãs – fundadas na noção da criatura humana como dotada de alma pelo seu Criador e, portanto, capaz de atos de nobreza, bondade, generosidade, empatia e amor, digna do Paraíso do pós vida – viram-se superadas pela liberação total das paixões sádicas. É a consagração do conceito animalesco do “homem máquina”, em que o ser humano se afirma como um mero símio evoluído, um simples “aparato orgânico” formado por músculos, sangue e ossos, desprovido de alma, logo de um valor transcendente.
Dessa forma, o humanismo reduziu o homem à condição de animal.
Não é de espantar, portanto, uma herança de leis não naturais , em diversos países, como no Brasil, em que a morte de determinadas espécies de bichos corresponde a penas mais severas do que o assassinato de uma pessoa.
Sade propunha o fim da família cristã, do sexo reprodutivo, a maior dádiva de Deus ao homem por permitir a perpetuação da sua maior criação. Em vez disso, ele defendia o abuso hedonista dos corpos humanos para o prazer sexual, especialmente o uso egoístico de mulheres, fossem adultas ou crianças.
Sade é o avô da revolução sexual moderna, antecessora de diversas pautas caras aos humanistas do século XXI, tais como: eugenia, zoofilia, necrofilia, pedofilia, entre outras agendas pós-cristãs.
Ao negar Deus, o iluminismo apostou suas fichas no controle da moralidade humana por um novo ente, idealmente regido pela racionalidade humana, expressa em leis e normas, dotado de uma supremacia moral digna das divindades de outrora: o Estado moderno.
Seja a serpente no Jardim do Éden um alerta mitológico ou uma verdade da fé, o fato permanece: o iluminismo se comporta como o ofídio demoníaco, sussurrando em ouvidos humanos a perfídia de que, através do domínio do conhecimento, estes poderiam substituir Deus, tornando a si mesmo deuses.
Essa ambição satânica cega a mente e convida a guilhotina a lhe cortar a cabeça, ao confrontar a mais básica verdade da condição humana. Surgidas ou não do amor do Criador por nós, somos criaturas cheias de falhas e enganos. O erro, o malfeito, o vício integram a nossa natureza.
Daí, todas as obras humanas, a própria razão humana, encontram-se condenadas à imperfeição.
As leis alegadamente racionais que regem um suposto Estado lógico, impessoal e eficiente são um conceito absurdo e inatingível em si mesmo.
O Estado moderno é anticristão por que sua moralidade secular é anticristã.
A moralidade secular não existe em si mesma, apenas se ergue em oposição às virtudes do cristianismo. Por se fundamentar no ódio, em vez de no amor, ela nega o pressuposto básico do amor: a verdade.
Destarte, o secularismo desponta como o próprio relativismo disfarçado de edifício da moralidade, pois, na realidade, limita-se a um conjunto de “valores” e “conceitos” maleáveis, frouxos, inconsistentes.
Tome-se o assassinato de bebês no ventre materno como exemplo desse relativismo que soa normal ao homem do século XXI.
Para suavizar o horror desse ato inimaginável, as sociedades ocidentais modernas cunharam o termo aborto, mais palatável às frágeis sensibilidades modernas.
Primeiramente, a moralidade secular, expressada em leis “impessoais”, aplicadas pelo tal Estado “racional”, admitiria o aborto somente em casos extremos, assim como uma gravidez resultante de estupro ou se representasse risco de morte para a mãe.
Contudo, a moralidade secular, desprovida da solidez e perenidade da moralidade religiosa, é relativista, logo aberta a “evoluções” e “adaptações”. Destarte, não tardou para as chamadas “democracia avançadas” legalizarem o aborto até o terceiro trimestre de gestação.
Hoje, nos EUA, o campo ideológico progressista já defende o aborto até os nove meses de gestação ou mesmo sua realização no momento do parto.
Alguns ativistas mais radicais começaram a propor o dito “aborto pós-parto”, arguindo a partir de quantos segundos, minutos ou horas seria permito à progenitora exterminar um recém-nascido vivo, saudável ou não.
Mentes eugenistas, portanto, revolucionárias, debatem abertamente sobre o uso da eutanásia infantil para crianças pequenas que desenvolvam doenças graves.
Por exemplo, um casal poderia “abortar” seu filho de quatro anos, desde que este apresente um diagnóstico com uma enfermidade severa.
No Canadá, essa discussão já se encontra bem avançada, buscando a liberação da eutanásia infantil no sistema público de saúde.
Essa deterioração moral e cultural causada pelo experimento secularista não escapa à percepção das camadas cristãs ainda existentes nessas sociedades, ampliando, cada vez mais, o sentimento de abismo crescente entre religiosos e humanistas. Ambos os lados parecem viver em culturas distintas, cujos valores se apartam de forma irrefreável, sem solução.
A malfada tentativa de erigir um Estado anticristão, secular e humanista parece chegar ao fim, exaurida e fracassada, legando ao mundo um histórico de aparatos estatais tirânicos e assassinos como jamais vistos na história da humanidade; monstros burocráticos, amorais e autoritários, como: a Alemanha nazista, o Estado soviético e a China comunista.
Em outras palavras, ao afastar Deus, os humanistas abriram as portas do Inferno e destruíram o Ocidente a partir do massacre introduzido pelas revoluções iluministas do século XVIII.
Uma terrível herança de destruição civilizacional.